A educação infantil é a primeira etapa da educação básica e destina-se a crianças de zero a seis anos. Ela não é obrigatória, porém um direito a que o Estado tem obrigação de atender.
As instituições que oferecem educação infantil, integrantes dos sistemas de ensino público, são as creches e as pré-escolas. Para estas, a clientela divide-se pelo critério exclusivo de faixa etária (zero a três anos na creche e quatro a seis anos na pré-escola).
As particularidades da faixa etária de zero a seis anos exigem que a educação infantil cumpra duas funções indissociáveis e complementares: cuidar e educar. Contemplar o cuidar na esfera da instituição de educação infantil significa compreendê-lo como parte integrante do educar.
Hoje, o atendimento à criança de zero a seis anos pode ser considerado não só como uma necessidade decorrente das condições de vida nos grandes centros urbanos, mas como uma realidade. As características da nossa sociedade têm imposto a necessidade de as crianças serem colocadas cada vez mais cedo, e num período maior de tempo, em instituições de educação infantil.
O atendimento educacional na faixa etária de zero a seis anos vem correspondendo, há alguns anos, às necessidades e modificações sociais próprias de nossa sociedade.
A inserção crescente das mulheres no mercado de trabalho, para garantia da sobrevivência da família em suas necessidades básicas ou na realização profissional enquanto indivíduo desencadeou a busca e a oferta por esse tipo de atendimento, tanto na rede pública como privada.
Para Oliveira (1992), a história das creches corresponde às modificações do papel da mulher na sociedade e suas repercussões no âmbito da família, em especial no que diz respeito à educação dos filhos. As modificações que vêm ocorrendo nas creches ao longo dos anos devem ser compreendidas dentro de um contexto sócio-político e cultural que inclui a expansão da industrialização e do setor de serviços, em escala crescente, decorrente da urbanização.
No Brasil, a educação da criança pequena fora do espaço doméstico e do convívio familiar, iniciou-se no final do século XIX a partir de diversos contextos de demandas, ora como forma de combate à pobreza, na perspectiva do Estado, ora como salário complementar, na perspectiva da família.
Segundo Kishimoto (1986); Kuhlmann Júnior (1991); Oliveira (1995) duas concepções de serviços voltados para o atendimento infantil têm sido adotada em nosso país, referindo-se assim, a duas classes sociais distintas: a chamada “assistencial” para a criança pobre em instituições como as creches, salas de asilo e escolas maternais, e a do tipo “educacional”, para a criança de classe média, nos jardins de infância e pré-escolas.
A este propósito, Oliveira (2000) assim se manifesta:
Assim, enquanto os filhos das camadas médias e dominantes eram vistos como necessitando um atendimento estimulador de seu desenvolvimento afetivo e cognitivo, às crianças mais pobres era proposto um cuidado mais voltado para a satisfação de necessidades de guarda, higiene e alimentação (p. 17).
Para Vieira (1999), a trajetória das creches e escolas maternais foi marcada pela tradição assistencial, destinada às crianças das famílias pobres. Segundo essa autora, em nosso país, enquanto modalidade de guarda diária de crianças pequenas, as creches surgiram para atender às necessidades do trabalho feminino industrial, respondendo assim a questões como o abandono, a desnutrição, a mortalidade infantil, a formação de hábitos higiênicos e a moralização das famílias operárias.
A concepção assistencialista de creche permeou a maioria das instituições de atendimento infantil conveniadas com órgãos de bem estar social, onde a preocupação educacional, quando existia, era secundária.
Segundo Oliveira (2000), a perspectiva política do atendimento assistencialista nas creches sofreu modificações:
Apenas quando segmentos da classe média foram procurar atendimento em creche para seus filhos é que esta instituição recebeu força de pressão suficiente para aprofundar a discussão de uma proposta verdadeiramente pedagógica, compromissada com o desenvolvimento total e com a construção de conhecimentos pela criança pequena ( p. 18).
Os primeiros jardins-de-infância no Brasil, pioneiros das pré-escolas de hoje, foram criados a partir de modelos desenvolvidos em outros países e eram destinados a crianças de famílias mais abastadas, respondiam aos objetivos de socialização e à preparação da criança de quatro a seis anos para o ensino fundamental.(Kishimoto,1986)
Os jardins de infância ou escolas infantis originaram-se no âmbito público governamental com algumas iniciativas particulares. Sua expansão foi lenta e gradual até os anos 1970, apesar de um início de crescimento nos anos 1950 com a criação das classes de pré-primário, anexas aos estabelecimentos de ensino fundamental. (Vieira, 1999).
Referindo-se ao assunto, Campos et al (1995) afirmam:
Dessa forma, pode-se considerar que, na faixa de 0 a 6 anos de idade, consolidaram-se dois tipos de atendimento paralelos : o que se convencionou chamar de creche, de cunho mais assistencial e de cuidado, e a pré-escola, ligada ao sistema educacional e refletindo suas prioridades de caráter instrucional ( p.104).
Nas décadas de 70 e 80, movimentos operários e feministas marcaram a luta pela democratização do país e pelo combate às desigualdades sociais. Esses movimentos ampliaram o atendimento educacional infantil, em prol da democratização da escola pública brasileira.
No entanto, nessa época, a luta por creches pressupunha apenas o direito da mulher trabalhadora e não o entendimento do papel educacional da creche, ou seja, a creche era vista como espaço de cuidado, assistência e guarda e não como um espaço de educação.
A Constituição Brasileira de 1988 teve um papel decisivo na afirmação dos direitos da criança, pois ampliou o que a Consolidação das Leis Trabalhistas -CLT de 1942 já consagrava como direito das mulheres trabalhadoras à amamentação de seus filhos, legitimando o direito à educação da criança nos seus primeiros anos de vida.
Ao definir, como direito da criança de 0 a 6 anos de idade e dever do Estado, o atendimento em creche e pré-escola (Art. 208, inciso IV), a Constituição criou uma obrigação para o sistema educacional, pela qual teve que se equipar para dar respostas a esta nova responsabilidade .
Segundo Campos et al ( 1995):
A subordinação do atendimento em creches e pré-escolas à área de Educação representa, pelo menos no nível do texto constitucional, um grande passo na direção da superação do caráter assistencialista predominante nos programas voltados para essa faixa etária( p. 18).
Para Rosemberg (1995), a década de 90 anunciou uma nova etapa, marcada pela política de educação infantil difundida pelo MEC em 1993, através da Coordenação da Educação Infantil -COEDI, a qual reafirmou e operacionalizou os preceitos da Constituição de 1988.
Passos significativos foram dados nos últimos dez anos para a garantia da consolidação do atendimento educacional das crianças na faixa etária de 0 a 6 anos, dentre eles o Estatuto da Criança e do Adolescente -ECA (1990,art. 54, IV), que integra a família como parceira da escola na definição de propostas pedagógicas.
A nova Lei de Diretrizes e Bases -LDB, Lei n°9394 de 1996, incorporou a educação infantil no primeiro nível da educação básica.
Inserida no sistema educacional, a educação infantil é desenvolvida em regime de colaboração nas diferentes instâncias União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Cabe à União a coordenação da Política Nacional de Educação e ao Município o oferecimento da educação infantil em creches e pré-escolas, mas ambas as instâncias mantendo como prioridade o ensino fundamental. Ao Município compete também baixar normas complementares às leis maiores, bem como autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos de seus sistemas de ensino, e aqueles mantidos por particulares.
Um dos critérios de credenciamento de instituições de educação infantil é a proporção criança /educador, sendo que essa proporção expressa uma medida e contribui para a avaliação da qualidade do atendimento que, por outro lado, acentua o alto custo desse serviço.
Apesar de suas conquistas, a educação infantil ainda não é obrigatória e nem prioritária aos municípios, sendo considerada uma segunda prioridade educacional.
Segundo Nascimento (1999), alguns municípios privilegiaram a implantação ou aprimoramento da pré-escola e do ensino fundamental em detrimento da creche, que por suas características apresenta um custo elevado, dificultando, assim, a participação de verbas públicas na ampliação e manutenção desse atendimento.
No Brasil, existem hoje aproximadamente 25 milhões de crianças de zero à seis anos. Apesar da dificuldade de se obter dados precisos do atendimento infantil em instituições, estimam-se conforme o IBGE que 30% dessas crianças estão freqüentando instituições de educação infantil.
Observa-se uma diferença na distribuição geral do atendimento por faixa etária na creche e na pré-escola: 6,3 milhões de crianças brasileiras de zero a seis anos freqüentam essas instituições no Brasil.
Na faixa etária de zero a três anos somente 8,3% dessas crianças estão matriculadas em creches e 57% na faixa etária de quatro a seis anos estão matriculadas em pré-escolas. As crianças que têm mais acesso à educação infantil são as mais velhas e as pertencentes a famílias das zonas urbanas e com renda superior a cinco salários mínimos.
Se levarmos em conta as instituições de educação infantil que não estão cadastradas no MEC/SEF/COEDI, certamente a porcentagem de matrícula em creches e pré-escolas seria maior.
A nova LDB, promulgada em dezembro de 1996, faz referência à educação infantil quanto à finalidade deste atendimento, na seção II, Art. 29 do capítulo sobre a educação básica:
A Educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos: físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (p.16).
Houve um aumento significativo no atendimento em creches e pré-escolas nos últimos anos, refletindo uma tendência à universalização da educação infantil em contexto institucional. Reforça-se, portanto, a concepção de que a creche constitui um bem, uma conquista, um direito não só para o filho da mãe trabalhadora, mas uma instituição educacional potencialmente destinada a todas as crianças.
Por outro lado, ao reservar um capítulo exclusivo para a educação especial, a nova LDB reafirma o direito à educação pública e gratuita de crianças portadoras de necessidades especiais, como prediz no capítulo V -Art 58:
Entende-se por educação especial, para os efeitos desta lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais (p.23).
Embora esse oferecimento seja preferencialmente na rede regular de ensino, esperamos que todas as crianças possam ser atendidas nas creches e pré-escolas e não apenas algumas delas como sempre ocorreu. De fato, a Lei não define esse atendimento exclusivamente no ensino regular, como defendemos neste estudo.
A educação infantil através da nova LDB passou a ser oferecida em espaços educacionais com propostas de caráter pedagógico, entretanto a educação especial para crianças desse nível de ensino ainda mantém seu caráter clínico e segregativo, que já se evidencia nos programas de estimulação precoce.
Embora não haja dados precisos do número de crianças com deficiência na faixa etária de zero a seis anos no Brasil, estima-se que a população brasileira acometida de deficiência seja de 10% do total de habitantes e somente 1% delas recebe atendimento em instituições educacionais, (MEC/SEESP, 1994).
Dessa baixa porcentagem que recebe atendimento educacional, o maior número de crianças que compõe o grupo de alunos com deficiência nas escolas brasileiras está concentrado no ensino fundamental, onde estão 52,3% das matrículas.
Na educação infantil a distribuição se faz em 7,7% de matrículas para a creche e 17,9% para a pré-escola.
Tendo em vista que são irrisórios os números de matrículas de alunos com deficiência na educação básica em geral, podemos avaliar o quanto é insignificante ainda o atendimento dessas crianças na educação infantil.
Para Sassaki (1997), a conquista do direito básico à escolarização, pré-requisito para o exercício da cidadania, requer um crescente esclarecimento e envolvimento da sociedade na inserção da criança com deficiência na escola, desde seus níveis iniciais.
Ao nosso ver, a inclusão dessas crianças não deve ser limitada apenas ao ensino fundamental, mas estender-se principalmente à educação infantil que, apesar da não obrigatoriedade, concorrerá para que a escola seja aberta às diferenças e atenda incondicionalmente a todas as crianças.
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